Liége Farias é cronista literária |
No tempo que Manaus era um ovinho, uma prima minha hospedou uma afilhada que quase a levou para o brejo.
Manaus, saindo da década de 60, todos praticamente se conheciam e algo provinciano pairava no ar. Cidadezinha pacata, boa de se viver, poucos carros, vizinhança amável e uma comunidade de muito respeito. Existiam os prostíbulos, lugares em que os homens procuravam as prostitutas. O mais famoso de todos era o "Lá hoje".
O povo de Manaus sempre idolatrou a cidade do Rio de Janeiro. Quem tinha um dinheirinho passava férias na Cidade Maravilhosa, a vida do carioca seduzia os amazonenses e quem possuia condições financeiras boas fazia questão que seus filhos estudassem no Rio. Só que a terrinha do Pão-de- Açúcar era sedutora por demais e a garotada divertia-se muito mais que estudava. Existiam outros perigos também.
No meio de tanto glamour, minha prima Zezé, toda animada, arrumava um quarto para receber toda contente, uma adolescente carioca da gema, filha de uma amiga de infância que fixou residência em Copacabana, a Princesinha do mar.
Zezé era casada e ainda não tinha filhos, receber a Lena para ela era uma novidade e tanto!
Lena chegou, lembro que a garota desembarcou no Aeroporto de Ponta Pelada, com um gingado no andar, cabelos soltos ao vento, bonita de machucar e um carioquês espetacular. Menina do Rio, terra do mar, do Maracanã, do Flamengo, terra da ousadia!
Ousadia, o Rio sempre foi ousado, sedutor, comtemporâneo demais, garotas de Ipanema, mocinhos bonitos que sempre viveram na Praia de Copacabana.
Leninha chegou e abafou! Apenas 14 anos e um mulherão para 500 talheres!
Zezé recebeu a filha da amiga com açúcar e com afeto. Fez creme de Cupuaçu, costela de tambaqui assada ao molho de maracujá,pato no tucupi com muito jambu...
Lá pelo décimo dia, Zezé farejou alguma coisa de podre no ar. Lena veio passar 20 dias com os Manauaras, entretanto já havia pintado e bordado, namorou vários caboquinhos e esnobava todos.
Zezé, macaca velha, andava desconfiada que algo estava rolando entre a menina do Rio e o seu marido Neco. Neneco estava estranho, sempre de conversinha com a carioca, altas risadas, nunca foi de contar piadas mas resolveu ser um piadista militante só para sentir as gargalhadas da carioquinha. Zezé sentiu o sangue de índio e português que corria em suas veias, ferver. Essa não! Hospedando uma cobra, uma víbora, uma traíra? Neco, até então um marido exemplar, colocando as manguinhas de fora! Essa hóspede era o próprio diabo!
Depois que viu a cena constrangedora, Zezé foi até a Agência de Viagem e marcou para o dia seguinte o retorno da moça que veio de longe. Se não me falha a memória, a companhia era a Vasp. No outro dia, Zezé levou Leninha ao Aeroporto de Ponta Pelada e só saiu de lá quando viu a aeronave decolar. Depois, voltou para a vida cotidiana e nunca mais hospedou quem quer que seja em toda a sua vida!
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