Carlos Costa é jornalista e Assistente Social |
Também acordei coberto por uma claridade abafada que anunciava o dia e decidi acompanhar minha esposa Yara à Feira, porque os “poetas da madrugada estavam para chegar”. Enfrentei os mesmos problemas de sempre - falta de local para estacionar na área, cuja solução será resolvida só quando o Porto de Manaus de embarque de cargas e passageiros de barcos regionais for transferido para o porto da Ceasa, sem atrapalhar o trânsito, ideia defendida há muitos anos pelo ex-prefeito Manoel Ribeiro, retirado do cargo por intervenção decretada pelo ex-governador Amazonino Mendes. Caso contrário, será mais uma batalha perdida pela Prefeitura de Manaus.
Mas isso é para as autoridades resolverem; não para um cronista que espera ansiosamente seus “poetas da madrugada” para um almoço. O tempo passava e nenhum chegava! Todos começaram a chegar depois das 12 horas. Mas para mim, que já os esperava desde às 11 horas da manhã, todos estavam demorando muito, fazendo aumentar meu nervosismo. Flávio Queiroz chegou primeiro, carregando sua geleira; Marcelino Ribeiro telefonou informando que chegaria antes de uma hora da tarde e cumpriu a promessa, chegando com sua cabeça raspada, banjo, violão e seu atabaque. O pintor Moacir Andrade, chegou logo depois carregando o corpo elegante, mas diabético, do alto dos seus 87 anos de vida. Chegaram juntos, Moacir ladeado com o poeta sexagenário José Coelho Maciel e também membro do Clube da Madrugada, desde 1966. Estava quase completo, mas faltava o principal convidado, o poeta Jorge Tufic!
Eu e minha esposa Yara, compramos um tambaqui de rio, grande, gordo e mais gostoso do que os de viveiro que, embora tenham melhorado muito em sua qualidade e sabor, continuam sendo “assassinados” com um pouco mais de 2 kilos para não dar prejuízo aos criadores com alimentos, mas ainda não pode ser comparado ao autêntico tambaqui de rio, sempre mais gostoso e consistente. Até mesmo os tambaquis de rio já não têm tamanhos imensos como os que meu pai pescava no Varre-Vento, com peso variando de até 30 ou 40 quilos; parece que também estão sendo pescados de forma indiscriminada e nem têm tempo de cresce!
Voltei para casa com dois tambaquis e comecei a escrever essa crônica, mas não me cabendo dentro de meu desejo de reencontrar pessoas queridas como o poeta Jorge Tufic, um dos fundadores do Clube da Madrugada, a quem havia conhecido na década de 80, durante um programa de entrevistas ao vivo apresentado na TV Amazonas, por Consuelo Nunes, que depois me fez enfrentá-lo em uma disputa do “Melhor Escritor do Ano”, juntamente com o também escritor Danilo Du Silvan que denunciara, mas não provara qualquer fraude.
Como eu poderia ganhar de meu ídolo? Nem queria!
Telefonamos – eu e o poeta, pintor e livre pensador Maciel - muitas vezes para o hotel em que Jorge Tufic se encontrava hospedado, afinal, todos estavam na Área da Churrasqueira do Condomínio Mundi para vê-lo e abraçá-lo - José Coelho Maciel, Marcelino Ribeiro e Flávio Queiroz e Moacir Andrade. Durante a conversa alegre e desorganizada, antes da chegada do poeta Jorge Tufic, eu fiquei sabendo que o pintor Moacir Andrade também tinha sido um dos fundadores do Clube da Madrugada. Depois, chegaram mais convidados, porém um de cada vez!
O nervosismo estava aumentando e aquele que todos esperavam - o consagrado poeta Jorge Tufic - informava por telefone que estava resolvendo “uns” problemas de transferência de hotel. Depois, se deslocaria ao local do encontro com seu filho “Jorginho”. Chegou depois das 16 horas e foi aplaudido por todos. Antonino Bacelar, poeta, médico e professor aposentado da Fundação Universidade do Amazonas, ainda não havia chegado. Compareceu a tempo de conversar ao pé do ouvido com Jorge Tufic.. Disse depois que só estava pedindo o endereço do poeta para visitá-lo quando fosse à Fortaleza.
Marcelino informava que “já me considero um amazonense” sempre respondendo em versos, quando todos o questionavam sua origem paraibana. O poeta também cantou músicas do compositor/cantor da Ilha Tupinambarana Chico da Silva e até tentou interpretar algumas com minha enteada, a cantora Bella Queiroz, depois que entoou sua música preferida “hoje só voltarei amanhã porque vou beber...” sempre improvisando um final diferente para a mesma música, fazendo sempre um verso de improviso sobre o dono da festa. Todos se divertiam e conversavam em volume elevado, até que Marcelino, dizendo que teria outro compromisso decidiu levantar-se com sua esposa Susan e sair, mas o principal poeta esperado estava demorando muito. Jorge Tufic, chegou ao local por volta de 16:40 horas, também carregando seus mais de 80 anos, acompanhado pelo filho “Jorginho”. Todos os cumprimentaram inclusive minha esposa Yara. Deixe-lhe um abraço forte e o Jorge Tufic sempre levando um lenço ao seu vasto bigode negro e depois o levava aos olhos, como se estivesse emocionado.
Fiquei tenso porque estava recebendo o criador do movimento “Poesia no Muro” uma influência do movimento “Poesia Concreta”, defendido na Semana de Arte Moderna, em SP, de 1822, que chegara tardiamente à capital do Amazonas, cidade isolada e sem muitos meios de comunicação, com telefone funcionando só através da inexistente Camtel – Companhia Amazonense de Telecomunicações. O clube dos “cavaleiros de todas as madrugadas”, como costuma dizer Jorge Tufic, foi fundado na madrugada do dia 22 de novembro de 1954, com outros amigos intelectuais que viviam isolados do mundo. O Clube da Madrugada nunca teve uma sede própria: “seus escritores sempre se reuniram embaixo de um “mulateiro”, na Praça Heliodoro Balbi”, afirma o contista Adriano Aragão. Também não possui estatuto escrito porque os membros como eu e o médico Simão Pecher, empossados na década de 80, pelo ex-presidente do Clube, padre Nonato Pinheiro prosseguem com a tradição: “onde estiver um ou mais escritores reunidos falando de cultura, lá estará também se reunindo o Clube da Madrugada”. Garante também Adriano Aragão: “o Clube da Madrugada é reconhecido não apenas no Brasil, mas em várias partes do mundo”. É...o escritor tem razão!
Foram os mais importantes fundadores do Clube da Madrugada ao amanhecer daquela madrugada os jovens intelectuais idealistas Celso Melo, Farias de Carvalho, Fernando Colyer, Francisca Ferreira Batista, Humberto Paiva, João Bosco Araújo, José Pereira Trindade, Luiz Bacellar, Saul Benchimol, Tedodoro Botinelly, Jorge Tufic e Moacir Andrade, e alguns hoje já falecidos; outros corroídos e envelhecidos pelo tempo, mas sempre deixando novas gerações como eu e outros que ainda virão, para continuar o legado histórico!
Pelo Skype, informei ao Jorge Tufic que havia conversado com a poetisa Tarciana Portela, lançada ao Brasil inteiro por ele, através de 3 mil exemplares do LIVRORNAL, distribuído de graça pelo poeta, direto de Recife. Tarciana Portela se apresentava com a mais nova promessa da poesia do Amazonas, mas sem nenhum livro, ainda. “Tarciana, você uma promessa e eu tenho mais a perder do que você porque perderei minha credibilidade se você não for um fenômeno literário”, disse-me Jorge Tufic. Quando falei que a poetisa estava morando em Recife e me disse: “pensei que ela ainda estava residindo em Manaus”, disse-me seu “descobridor”.
Poetas, escritores de qualquer estilo ou preferência e cronistas não se descobrem; eles já nascem prontos e são lapidados pelo tempo!
A pesquisadores da obra musical de Pedro Amorim – não sei se o homenageado pertenceu também ao Clube da Madrugada - de quem receberá o resultado de sua pesquisa de mestrado, com quem tive o prazer de conviver durante o tempo em que ele dirigiu o Teatro Amazonas e eu era um jovem aspirante a ator de teatro, na trupe do teatrólogo Álvaro Braga. À Karine Aguiar, também cantora, que me presenteou com seu CD “Arraial do Mundo”, conversou informalmente com o pintor Moacir Andrade, que lhe contou muitas histórias conhecidas e vividas por ele, sobre seu homenageado. Mas saiu antes da chegada do poeta Jorge Tufic – para mim era uma espécie de Deus da cultura, um mito! – não sei nem se isso existe - de quem já tinha lido livros e escutado comentários elogiosos. Nosso primeiro encontro se deu no Estúdio da TV Amazonas, durante a apresentação do programa de entrevistas apresentado por Consuelo Nunes - eu divulgando meu primeiro e único livro de poesias,(DES)Construção....(1978) lançado com sucesso no salão de espelhos do Atlético Rio Negro Clube e Tufic, comentando um de seus mais de 50 livros já lançados.
De Moacir, durante a conversa alegre e informal, tivemos a informação de suas viagens e exposições no exterior e o seu conhecimento com as celebridades de Manaus e do mundo.
Um dia todos eles saberão que vivi uma tarde das mais felizes dos últimos tempos! Mas outras poderão acontecer, talvez, porque o amanhã só a Deus é dado conhecer!
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