Deputados e senadores estão
debruçados sobre a decisão de ontem do Supremo Tribunal Federal (STF),
determinando o fim do foro especial para crimes cometidos fora do mandato ou
sem relação com ele. Na forma como foi tomada, ela deixa margem mesmo a um sem-número
de dúvidas e questionamentos. Mas nossos parlamentares deveriam mesmo era ficar
preocupados com Operação Câmbio, Desligo, deflagrada ontem pela Polícia Federal
(PF), sob o comando do juiz Marcelo Bretas.
A operação tem como alvo uma
rede de 53 doleiros, denunciada pelos delatores Vinicius Claret (codinome “Juca
Bala”) e Cláudio Barbosa (“Tony”), cujo centro é ninguém menos que o carioca
Dario Messer, uma espécie de “doleiro dos doleiros” que opera desde os anos
1990 como uma espécie de Banco Central da lavagem de dinheiro.
Messer é um personagem capaz
de aparecer com destaque como sócio do ex-jogador Ronaldo Nazário, amigo do
presidente paraguaio, Horacio Cartes, do genro do russo, Vladimir Putin, e numa
miríade de escândalos de corrupção no Brasil e exterior.
Seu nome foi citado na
delação do doleiro Alberto Youssef no Caso Banestado, de 2003, como o “maior
doleiro do país”. Voltou a surgir na Operação Farol da Colina, no escândalo do
Propinoduto, no Mensalão (como "operador do PT"), no Swissleaks (que
revelou contas secretas de celebridades na filial suíça do HSBC) e,
naturalmente, na Lava Jato.
Operando em parceria com a
família paulistana Matalon, Messer é sempre mencionado como fornecedor de
dólares aos demais doleiros para as operações ilegais. Desta vez, na Câmbio,
Desligo, ele é apontado como o centro de um esquema de lavagem de US$ 1,6
bilhão, por meio de 3 mil offshores em 52 países.
De acordo com a delação de
Claret e Barbosa, que mantiveram registros das transações internacionais que
passaram por eles por meio de um sistema chamado “Bankdrop”, o esquema foi
usado pelo ex-governador Sérgio Cabral para tirar US$ 85,4 milhões do país.
A especialidade da dupla era
fraudar o uso das contas CC5, autorizadas pelo Banco Central para a modalidade
de transferência conhecida como “dólar-cabo”. Por meio delas, o dinheiro
viajava ao exterior rumo a paraísos fiscais, ou voltava ao Brasil. O esquema
casava oferta e demanda por dólares e reais, de modo a otimizar as
transferências.
O método foi imitado por
todos os doleiros que operavam com lavagem de dinheiro, entre eles o mais
célebre, Alberto Youssef, uma espécie de delator-máster da Lava Jato. Segundo a
investigação da PF, a rede de doleiros em torno de Messer movimentou bem mais
dinheiro que ele próprio, tendo deixado vestígios identificados nas Operações
Satiagraha, Castelo de Areia e no caso Siemens.
Messer não é eficaz apenas
na evasão de divisas. Ao longo dos anos, demonstrou também um talento notável
para evadir-se ele próprio. Assim que o juiz Sérgio Moro começou a obter os
depoimentos de Youssef no caso Banestado, naturalizou-se uruguaio e escapuliu
para o país vizinho (seu parceiro Marco Matalon seguiu a mesma rota). Vivia
recentemente entre Rio e Paraguai e, até ontem, continuava foragido.
Messer é visto como o centro
de uma espécie de sistema circulatório, por cujos vasos escoa quase todo
dinheiro sujo desviado no Brasil. É incomensurável a quantidade de informações
que os procuradores cariocas poderão coletar a partir das prisões realizadas
ontem. Youssef era apenas uma artéria – bojuda, é verdade – que conectava o
fluxo financeiro à Petrobras e a outras estatais. Messer é o coração.
A partir de agora, será alvo
de uma nova caçada internacional. Bretas, como Moro, faz parte de uma geração
de juízes obstinados. Não desistirá de lançar quantos arpões estiverem a seu
alcance para pegar a baleia branca que há pelo menos 15 anos foge da Justiça.
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